terça-feira, 15 de setembro de 2009

meninos da vida

O que éramos nunca foi importante.

Éramos nós. Os meninos esquecidos
Num bairro pobre de um país sem recursos
No meio de uma metrópole rica,
No centro pobre da América Latina.
Sem hospitais
Nem escolas.
Muitas vezes sem pão.
E isso não era ruim. Vivíamos sem a consciência do que éramos.
Vivíamos.

Mas o circo havia. O circo era nosso.
Éramos mestres do nosso picadeiro.

As janelas abertas davam-nos outras visões.
O quintal de terra
O velho abacateiro
O pé de pêra.
Os cães gordinhos de comer angu
Que nunca souberam o que era veterinário.

Éramos vida.
Muitas vidas em perninhas secas sujas de terra vermelha,
Com catarro no nariz
Correndo atrás da bola murcha.

Éramos meninos-homens
Meninos-feios
Meninos-magros
Meninos doentes
Meninos-criativos.

Crescemos querendo abrir mais portas que janelas.

E quando fomos amadurecendo
As janelas tornaram-se mais importantes
Como se no horizonte
Buscássemos a perspectiva para o desejo de um bom desenho.

Hoje continuamos esquecidos. De um outro modo.
Hoje somos mais responsáveis por nosso próprio esquecimento.

Hoje somos homens querendo ser meninos
Homens feitos
Homens feios
Homens doentes
Homens vazios,
Com um talão de cheques no bolso
E um carro velho na garagem.

Hoje comemos macarrão com frango
E assistimos muita televisão aos domingos.
E cada domingo é ainda mais vazio.

Hoje somos pouco mais compostos.
E continuamos sempre chegando
Passando
Atravessando
As pontes de nossas ‘’ babilônias ‘’.
Outras agora. Novas. Nossas.

Hoje, viver é um outro reflexo. Outro deus.
Hoje conhecemos Narciso.

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